Entrei em casa apressada, depois de um dia longo e penoso de faculdade. Ansiosa por me recostar entre as minhas múltiplas almofadas, corri para o meu pequeno abrigo. Chegando ao quarto deparo-me com a minha gata. Lá jazia ela no meu lugar favorito, entre as fofas e altas almofadas, enquanto apanhava banhos de sol e se esticava ao som de Chopin, proveniente do escritório do meu pai. Tive pena de a enxotar. O seu pêlo cintilante - um misto de castanhos e laranja - contrastava com o meu agastado humor. Resplandecia à luz brilhante do sol. Não pude evitar sorrir perante tal cenário. Amoroso, quase mágico, de uma gata que se alongava felicíssima por receber os últimos raios de sol. Deitei-me ao pé dela. Mal me viu, recebeu-me com um rasgado miado de afecto, e com um ronronar irresistível, capaz de derreter qualquer coração amargurado. Ficámos assim, frente a frente. O que estaria ela a pensar? Pensaria de todo? Murmurei-lhe baixinho: “gostas de mim?”. Ela olhou-me com os seus grandes olhos amarelos. Bom, quem cala consente, pensei eu: “eu também gosto muito de ti…”. Espreguiçou-se novamente, rebolando para junto do meu peito. O seu ronronar, juntamente com a música de Chopin, criavam em mim um misto enorme de emoções. Acreditei que aquele momento não fosse durar muito. Porque nunca nada na minha vida durou muito. Principalmente as coisas boas. As más, por outro lado, duram mais do que aquilo que seria desejável para alguém sensível e fraco como eu. Perguntei à minha gata malhada se algum dia me iria abandonar. Ela não respondeu, virou a cara para os últimos resquícios de sol, que se punha lá longe. Repeti a pergunta, enquanto lhe afagava a testa pintada de amarelo. Aí respondeu-me com uma lambidela no nariz. Comovi-me com aquele gesto, talvez aquela gata realmente me conseguisse perceber. Talvez fosse ela a única a nunca me abandonar. Seria de facto a única a estar sempre do meu lado, apesar de tudo o que pudesse vir a acontecer? Apesar de todos os meus defeitos? Apesar de todas as mágoas que fui causando a todos ao longo da minha vida? Naquele momento, acreditei que sim. Apertei-a com todo o meu amor. Encaixámo-nos as duas e assim ficámos, como uma só, até ao anoitecer.
Wednesday, 11 April 2012
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